1.4.08

primeiro ato

pra falar da alma queria ter dedos de mel.
queria a sutileza de uma pele clara, sem passado, sem calo.
queria ser sem partida nem chegada: eu, desenlaçada.
senhora de mim, pedaço de rua sem estrada.
pra falar da alma queria eu ser solilóquio, diálogo interrompido, monólogo das águas.
eu, que sou só gole.
antes assim: perpetuada.
minha mise-en-scene construída. cortina tombada.
pra falar da alma eu queria ter nas mãos o que deixei na casa antiga: meus anos, minha fé, eu mulher adormecida.
mas o que vejo é só isso: escombros, sangue e músculo.