9.7.13

fluxograma


me explicaram certa vez:
abrir a geladeira é fazer planos. sentar no meio fio durante o desespero de uma chuva é fazer planos. desistir de escrever aquele texto é fazer planos. jurar que nunca mais é fazer planos. ficar em silêncio três dias inteiros, no tempo da travessia por uma cidade nova, é fazer planos. dizer eu te amo enquanto frita um ovo é fazer planos. preferir o amargo do limão no verão do que o doce do mel no inverno é fazer planos. ouvir os gritos que vêm da rua e sair de casa é fazer planos. encarar brasília ao longe e fechar a porta é fazer planos. fechar os olhos e sentir a ponta do dedo do pé molhar-se no mediterrâneo é fazer planos. dizer eu te amo arfando a subida da ladeira pela boca é fazer planos. escolher todos os vestidos que você nunca mais vai vestir em um sábado à noite é fazer planos. comprar sorvete de milho verde no dia mais frio do inverno é fazer planos. ligar para o seu pai sem motivo é fazer planos. ganhar na mega sena e continuar no seu emprego é fazer planos. desistir do seu emprego sem ganhar na mega sena ou qualquer outro tostão é fazer planos. mudar de idéia é fazer planos. esquecer que dia foi ontem é fazer planos. dizer eu te amo debaixo do chuveiro é fazer planos. admirar o jeito com que seu irmão come espaguete é fazer planos. chorar porque o cachorro magrelo da esquina não pode comer a ração do seu gato é fazer planos. encontrar aquele livro que você escondeu para um dia triste é fazer planos. entrar no cinema sozinho em um domingo de sol é fazer planos. dizer eu te amo pra ninguém é fazer planos. calar-se na frente da mulher amada é fazer planos. saber que nada que você pensa é nada até que um dia é fazer planos. 
todos falam dos poemas de amor, mas ninguém sabe mesmo onde é que dói uma segunda-feira. 

11.4.13

praga --- viena


os resquícios da neve no verde que ainda não floriu

minha primavera adiada, meu âmbar escondido

cadê a cor que eu deixei em você?
















perguntas que caminho nenhum traz

há que se inventar palavra nova pra dar conta desse trilho

só é quem não tem a estrada como par


13.3.13

inverno astral, tópicos de um março


aqui dentro venta tanto quanto ventaria se estivéssemos na sua varanda. a diferença é que lá sentaríamos com nossas caras prontas e ansiosas, esperando o tapa da brisa, que viria avisada, assim, como um hóspede.
aqui dentro não se espera outono nenhum. pescaria nenhuma tem lugar nesse mar morto, tão bem cultivado na minha memória.
anos novos se inauguram a cada angústia antiga. a vida é muito mais ontem do que amanhã. e fala de futuro quem não arde de saudade.
e há ainda os que digam que essas são palavras de morte. mal sabem que nada é mais vivo que meu inverno de véspera.

7.6.12

coleções



lavar os desejos com água de cheiro, vestir pra baile. costurar renda na lapela das vontades. se apegar, guardar, namorar. investigar os sonhos, saber de cor, lamber as crias. construir e desconstruir todos os dias as mesmas coisas, até que sejam outras a andar por perto. até que não sejam suas essas esquinas caseiras. amarrar no pé da cama as ideologias que te fazem ser metade. acordar e dormir encarando o susto de ser inteiro. 
pegar tudo que apraz, amarrar com laço de fita, enfeitar. proteger com plástico bolha sua pouca fé. guardar os gostos numa caixa com papel de seda. cuidar para que não se quebre cada estômago embrulhado.
até que dancem dentro de você as madrugadas. até que você chegue em casa enjoada do gosto do anis e tire os sapatos, ainda na porta. até que na cama você encoste, no travesseiro você encolha, nas fronhas você entorte. até que exausta, você não lembre mais de nada. e a dor do fim da festa te perfume a vida inteira.

27.12.11

chegada


'speak low when you speak love'

a ventania no portão de casa não chiava. as vírgulas, suspiros e sorrisos descansavam em volta. a primavera desesperada não poderia prever você.
a que sonhava, sonhava baixo, pra vida não acordar.
o sonho era curto, era susto. o sonho não previa você. no sonho não cabia você.
a que sonhava, sonhava pouco. doses eram costume.
os dias curtos tinham gosto de alerta, plaquinhas saborosas e desavisadas que brincavam na correria do destino.
a que sonhava esqueceu de acordar naquele dia. o que era curto virou imenso. o que era parede ganhou céu. muito sangue pra pouco corpo. muitas mãos pra pouca tarde.
agarrar com dedos o amor desperto. e aí sim: lá se vão os sonhos com os pés no chão.

todo dia.

1.9.11

hipótese

meus sonhos te olham dormir
os olhos navegam cada casa vazia
a minha, a sua
enquanto na rua
nossos pés dançam aquela valsa interrompida

18.5.11

correnteza


e lá se vai meu destino com sua fantasia de escafandro.